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Dependência de álcool e drogas: internação é a solução!?

  • Foto do escritor: Diego Augusto Santos
    Diego Augusto Santos
  • 30 de abr.
  • 3 min de leitura

Atualizado: 7 de mai.

Quando o assunto é o tratamento para dependência de álcool e drogas, quase que automaticamente associamos a internação em "clínicas de recuperação" como sendo a melhor indicação terapêutica. Mas será que é assim mesmo? Primeiro, precisamos entender como isso se tornou uma "verdade" ao longo do tempo. Existem pelo menos duas razões principais que podemos considerar. A primeira é histórica.


No Brasil, desde o fim do século XIX e ao longo de todo século XX, diversas instituições públicas se tornaram responsáveis pelo auxílio a pessoas com uso abusivo/dependência de álcool e outras drogas. Os chamados manicômios e hospitais psiquiátricos foram as principais referências para "tratar" da questão, em que as pessoas eram internadas quando apresentavam uso problemático de substâncias, seguindo o mesmo modelo hospitalar para tratamento de outras doenças, como tuberculose ou hanseníase. A lógica dessa prática consistia em isolar as pessoas para tratar a condição clínica e afastá-las do convívio social, uma vez que se foi percebendo que essas doenças eram transmissíveis.


O mesmo raciocínio foi empregado para o tratamento de usuários de álcool e drogas. Embora essa condição não se trate de patologia transmissível, o isolamento se realizou para atender a outra demanda, muito mais social do que de saúde: afastar os sujeitos problemáticos do convívio, considerando que o uso abusivo de substâncias frequentemente se relacionava com perturbação pública, mendicância e brigas em logradouros públicos.


A segunda razão para a internação se tornar algo tão naturalmente aceito é de ordem econômica. Não demorou muito para se perceber que o isolamento social era um negócio lucrativo. Já que era o Estado que arcava com as despesas de internação das pessoas dependentes de álcool e drogas, se tornava interessante manter essas pessoas o maior tempo possível internadas nos hospitais: quanto maior tempo fosse a permanência, maiores eram os lucros. E aqui temos mais um detalhe: em geral, nenhuma prática terapêutica era utilizada para tratar as pessoas com problemas com álcool e drogas. A concepção de que estando internada, portanto isolada do convívio social e abstinente do consumo, isso por si era suficiente para "tratar o vício".


Preciso dizer que esse é um ledo engano? Fosse tão simples, o problema estava resolvido. Mas o que vemos na prática é justamente o oposto: algumas pesquisas demonstram que mais de 95% das internações de usuários de substâncias psicoativas resultam em recaídas posteriores.


Contudo, essa modalidade vingou no Brasil, sobretudo pelas razões econômicas. Após décadas e décadas a fio mantendo instituições realizando esse "tratamento", a prática foi se tornando culturalmente aceita.


A internação em instituição psiquiátrica/hospitalar pode se fazer necessária, porém em situações bastante específicas e quando, em geral, representam risco de piora clínica do quadro do paciente (como, por exemplo, em abstinências graves de álcool ou de medicamentos opióides). Essas internações, contudo, não são necessárias para além de duas ou três semanas.


As internações nas Comunidades Terapêutica, nas famigeradas "clínicas de recuperação", em que se preconiza a internação prolongada, não raro de 3 a 6 meses, não possuem qualquer evidências científica/terapêutica. Isso mesmo: não há base científica que sustente que a internação prolongada se justifique. Como falamos anteriormente, são os interesses financeiros que, na imensa maioria dos casos, estão por trás de tais "prescrições" de tratamento.


O tratamento da dependência de álcool e outras drogas é perfeitamente possível de ser realizado ambulatorialmente, com frequentes visitas ao médico psiquiatra e semanais ao psicólogo, além de outros profissionais que podem contribuir, como educadores físicos etc.


A questão é complexa, exige paciência e comprometimento do usuário e familiares, além dos profissionais de saúde mental qualificados para darem o suporte terapêutico. As variáveis que atuam para o abuso/dependência de substâncias são inúmeras e não é atuando unicamente com o paciente num ambiente de internação/isolamento que progressos serão vistos.


Se a questão aflige você ou familiares seus, um conselho: procure profissionais qualificados e experientes que possam avaliar o contexto de forma cuidadosa, orientar e propor intervenções que tenham base científica: isolar em clínicas, na imensa maioria dos casos, não funciona!



 
 
 

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